Lygia Pape, Língua Apunhalada, 1968.
Silêncio espesso,

houve uma palavra
pronta, iminente
na ponta da língua
O suicida incerto
desistiu do salto

Silêncio espesso,

diariamente penso
na palavra não dita 
Não esqueço, não esqueço
que estive em pé
na estação rodoviária
com a palavra:

me despeço
e prossigo
sem dizê-a

Silêncio espesso,

a palavra 
não dita
me habita
Carregá-la
é saber outro corpo
dentro de si
seja um sexo
seja uma saudade

Silêncio espesso,

conheço a textura
da palavra não dita
a matéria pétrea

A natureza humana
me faz esculpir
um ídolo
com a palavra
não dita

O medito
em espesso
e monástico
silêncio

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