Olhos acesos Olhos luminosos de neon Olhos fosforescência felina Olhos pássaros sem pouso Olhos maçãs insones Olhos náufragos na escuridão do quarto Minha íris cor de uísque tristemente sóbria Minhas pálpebras mãos anciãs da extrema unção Olhos vagina líquida Olhos tateiam a nudez Olhos veem meus pensamentos Olhos leem os vossos Olhos não vislumbram o paraíso Vidência Poética reinvente meus Olhos.
Acesa como girassol de van gogh, no princípio. Incidindo sobre mesa e livros. Pétalas em chamas e aroma luminoso. São tantas formas de atear cores quentes à sobriedade do quarto: cortar os pulsos, acender um cigarro, pintar os lábios, descascar uma laranja, adotar um gato amarelo de olhos cintilantes. A mais simples: reatar o ciclo e substituir as flores do vaso. Se cultivasse diários, lembraria o momento exato em que julguei cruel tal rotina. O passado recente ainda recende seu sangue.
Jazz nos corredores do supermercado. Dedos frenéticos tamborilando meu crânio. Penso ao ritmo do piano. Labirinto de intestinos, a publicidade torna qualquer bosta indispensável. Meus ossos são tão brancos quanto o sorriso do creme dental. A criança vê com ternura o olhar asfixiado do peixe. Belos ganchos transpassam pedaços escarlates de carne. Tomates coagulados entre legumes fálicos. Cigarrinhos de chocolate ofendem a moral de hoje. Macarrão instântaneo, lata de atum ou salsicha, refeição dos solitários. O jazz silenciou, Carlo Marx ainda uiva, meu crânio não cala.
JACK KEROUAC: Fundamentos da Prosa Espontânea.
ESQUEMA: O objeto é situado diante da mente ou na realidade,
como se fosse um desenho (uma paisagem, uma xícara de chá ou um rosto ancião),
ou é situada na memória onde se converte em um desenho a partir da recordação
de uma imagem-objeto definida.
PROCEDIMENTO: Como
temporalidade de uma essência na pureza da palavra, a linguagem desenhada
consiste em um imperturbável fluxo de ideias-palavras pessoais e secretas a
partir da mente (como frases de um músico de jazz) sobre o sujeito da imagem.
MÉTODO: Nenhum ponto
e aparte separam as frases-estruturas já quebradas arbitrariamente por dois
pontos falsos e tímidas vírgulas usualmente desnecessárias - salvo vigorosos
hífens espaciais que separam o fôlego retórico (assim como o músico de jazz
respira entre as frases que sopra) - "pausas métricas que são o essencial
da nossa palavra" - "divisões dos sons que escutamos" - "o
tempo como anotá-lo" (William Carlos Williams).
ALCANCE: Nenhuma seletividade da expressão somente
acompanhar o livre desvio (associação) da mente até mares de pensamentos
ilimitadamente soprados-sobre-os-assuntos, nadando no mar do próprio idioma sem
outra disciplina salvo os ritmos da exalação retórica e o testemunho debatido,
BANG! (o hífen espacial) - sopre tão fundo quanto quiser - escreva com toda a
profundidade, pesque tão longe como te ocorrer, que tua satisfação vá primeiro,
logo o leitor não poderá deixar de receber o choque telepático e a
excitação-significado por meio das mesmas leis que funcionam em sua própria
mente humana.
INTERVALO DO
PENSAMENTO: Nenhuma pausa para pensar a palavra apropriada salvo a acumulação
infantil de palavras escatológicas básicas até obter satisfação, a qual
desembocará em um grandioso ritmo anexado ao pensamento e em concordância com a
Grande Lei do momento oportuno.
MOMENTO OPORTUNO:
Nada pode obstruir se flui no tempo e as leis do tempo shakespeareano que
enfatiza a dramática necessidade de expressar-se agora mesmo com a própria
maneira inalterável ou a língua sustentada para sempre - sem revisões (salvo
erros racionais, tais como nomes ou inserções calculadas como atos de não
escritura, somente inserção).
CENTRO DE INTERESSE: Não comece com uma ideia pré-concebida
sobre o que dizer da imagem somente como uma joia central de interesse no
sujeito da imagem no instante de escrever e escreva para adiante nadando no mar
da linguagem para uma liberação periférica e o esgotamento - nada de segundos
pensamentos salvo por razões poéticas ou pós-datas - Nunca volte a pensar para
"melhorar" ou sustentar impressões pois os melhores escritos são
sempre os mais dolorosos e pessoais arrancados pela força e lançados a partir
do berço protetor da mente manancial de ti mesmo, Sopra! Agora! - Tua maneira é
a única maneira - "boa" ou "má" - sempre honesta
("ridícula"), espontânea, "confessional" interessante,
porque não foi "elaborada". O ofício é o ofício.
ESTRUTURA DE TRABALHO: As modernas estruturas bizarras
(ciência-ficção, etc.) emanam da linguagem que morreu, temas "diferentes"
dão a ilusão de uma vida "nova". Segue asperamente linhas em
expansão, o momento mais que o tema, como a pedra em um rio, para que a mente
flua sobre a joia do centro da necessidade (que tua mente gire, de imediato)
até alcançar um ponto onde o que era um "começo" muito vago se
converta em uma necessidade aguda de "consumação" e a linguagem se
aproxime em uma corrida com os leitos do tempo - a corrida do trabalho,
seguindo as leis da Forma Profunda, até a conclusão, as palavras finais, a
última gota - a Noite é O final.
ESTADO MENTAL: Se for possível escreva "sem
consciência" um semi-transe (como na anterior "escritura-transe"
de Yeats) permitindo que o subconsciente com sua própria linguagem desinibida
interessante necessária e portanto "moderna" admita o que a arte
consciente censuraría, e escreva excitada e velozmente, sem cãimbras na escrita
manual e datilografada, conforme (como do centro à margem) as leis do orgasmo,
o "anulamento da consciência" segundo Wilhelm Reich. Vem de dentro, emerge
relaxado e dito.
Traduzido a partir de Beat days/Días beats: visiones para jóvenes
incorregibles, 2003, Miguel Grinberg.
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