Sinta o sutil
tremor do galho
ao amparar
o pouso

Menos suave
ossos arqueiam
sob o peso
de tantos
pensamentos

Precipitam-se palavras
contra os olhos abertos

Ao pedir alguma trégua
o pássaro se aproxima
bebe na poça de chuva
esgueira-se
entre as folhas
o vento frio
sussurra
nas sombras

ao fim de cada 
haiku lido
olhos espiam
pelo vidro
o céu cinza
leio a luz esmaecer 
sobre páginas de poemas

mendigo esmola
qualquer moeda
pela praça

entardecer de domingo
pais não querem
ensinar aos filhos
a caridade

sal paradise
ofertaria torta de 
maçã com sorvete
aos monges mendicantes

pensar a tristeza
insignificante
sob as estrelas

cada um 
a seu tempo
percorrerá o
caminho estreito

Roberto Bolaño e Mario Santiago.

Roberto Bolaño e Mario Santiago Papasquiaro.


   Em todas as entrevistas concedidas Roberto Bolaño define Mario Santiago como seu melhor amigo. Conheceram-se na juventude, aproximados pelo gosto comum da poesia, e pela maneira particular de compreender o poético: sua relação com a vida. Juntos fundaram o movimento Infrarrealista, mexendo nas estruturas poéticas mexicanas. 
   Bolaño eternizou (palavra que desagradaria ao autor, para quem nenhuma literatura é eterna) essa amizade no livro Los detectives salvajes: Roberto autorrepresentou-se no personagem Arturo Belano e Mario em Ulisses Lima. A obra foi lançada em 1998, mesmo ano da morte de Mario Santiago, que não chegou a lê-la, mas soube por carta que Roberto o transformara em um personagem. A narrativa que simbolizou essa amizade firmou Roberto Bolaño como um dos principais autores de língua espanhola da atualidade.
   Traduzo aqui um poema do Mario Santiago, escrito para "velho amigo" Roberto:




My oldie friend Roberto.



Todo o amor do mundo / com todos seus sangue & seus

            vírus



Desta embriaguez histórica te escrevo: Antologias? /

       Não hão tatuado nossas 

noites

Ri-se de seu mel a vagina

Imola-se a indomável verga / sem regresso /

Pedro Damián dixit: a poesia mexicana

Divide-se em duas: A poesia mexicana & o infrarrealismo!!!



Explodem aplausos

Obra & nomes?

Que dúvida sobre

Sobre esta ponte de 15 anos ((Psicotrópicos / Sexo insano))


Vá esse beijo

- Carontiano & Quasímodo - (Graves)

Bly / Lowell / Zimmerman?

Teu gesto

Tua agonia

Teu inexpugnável Simón Blanco


Sou peruano de Ayacucho

Terra vermelha são meus poros

Até em sonhos me lanço à queda

Brigada Je est une autre

Chango Casanova expulso desta vida pelos Cantinflas



Eu e tu recordando Anna Karina

cantar 1 bela canção contra o dinheiro



* Chango Casanova: boxeador mexicano.
* Cantinflas: ator e humorista mexicano.
* Anna Karina: atriz da Nouvelle vague.







My Oldie friend Roberto



Todo el amor del mundo / con todas sus sangres & sus

virus

 

Desde esta borrachera histórica te escribo: ¿Antologías? /

No las han tatuado nuestras

    noches

Se ríe de sus mieles las vagina

Se inmola la rejega verga / sin regreso /

Pedro Damián dixitl: la poesía mexicana

Se divide en dos: La poesía mexicana & el ¡¡¡Infrarrealismo!!!

 

Olas de olés

¿Obra & nombres?

Que duda el sobre

Sobre este puente de 15 años ((Psicotrópicos/ Jariosos))

 

Vaya este beso

– Carontiano & Quasimodo – (Graves)

¿Bly/ Lowell / Zimmerman?

Tu gesto

Tu muerevida

Tu inexpugnable Simón Blanco

 

Soy peruano de Ayacucho

Tierra colorada son mis poros

Hasta en sueños me tiro a la quebrada

Brigada Je est un autre

Chango Casanova expulsado de esta vida a los Cantinflas

 

Tu & yo recordando a Anna Karina

Cantar 1 hermosa canción contra el dinero







afilado ganido golpeia

lembranças oferecem alívio
ecoam o pássaro ferreiro
martelando o verde silêncio
canto que a mãe desenleara
de outros sons inominados

som limpo
soa aceso
lâmina 
recitando
o sol

interrogo se as lições
de um cão anônimo
seriam mais amenas
ao inserir no vocabulário
das crianças a palavra morte

cubro os ouvidos
para a analogia
com o pugilismo
das ondas contra

são punhaladas
o ritmo dos ganidos

Mario Santiago Papasquiaro



   Mario Santiago Papasquiaro integrou o grupo literário Infrarrealista, ao lado de Roberto Bolaño, que o considerava um genuino poeta, criador poético por essência. Talvez pelos  versos de Mario Santiago serem sobretudo imagéticos, explorarem a possibilidade metafórica das palavras, ao contrário da característica prosaica, narrativa dos versos de Bolaño. Na maioria das entrevistas, ao ser interrogado sobre os infrarrealistas, sobre a vida na Cidade do México, referia-se sempre a Mario como um grande amigo. Com bom humor recordava as peculiaridades do poeta mexicano, como o costume de tomar banho lendo livros, inclusive os que Bolaño o emprestava, contou que ao flagrá-lo não ficara bravo, ajoelhou-se diante da cena diante da cena inóspita, como se estivesse inebriado com a união limite entre vida e poesia.

SAN JUAN DE LA CRUZ DA 1 SUGESTÃO
A NEAL CASSADY / NA FRONTEIRA
ENTRE O MITO & O SONHO /

A estrada declina rumo ao centro do seu próprio
                            incêndio centrífugo
Tijuana desvanece flutuando sob a esfera do olho
Estilhaços de cabaré & camas empurram os rastros
dos duendes que enchem a ilusão deste instante
No rádio: Jim Morrison engole esporas crescidas
                        na cicatriz do dilúvio
Esta ponte mental vai ao voo
Estrelada por fora e por dentro
Verde cisco a selva
O destino girando
Todo ser & até nos postes cospem ovnis bordados
com asas dos mais loucos vaga-lumes
É noite / & na estrada / e voando
Os Doors com os dentes tornam realidade a voltagem
O corpo da alma se banha na viagem
O centro se curva
A curva é selvagem
A estrada é Deus mesmo
Cada gânglio / cada parte
esquiva: esfuma-se
O passo avançando
A mente arranca a euforia do eco.

O assassino sonâmbulo cruzou os portais do pesadelo vazio
Nevava na atordoada noite de abril
A porcaria de greve havia atingido suas têmporas
Apertava o herói seu abrigo escarlate sujo de esperma
A excitação o beijava os pés
Os sapatos / o olor a 1 destino pressentido em fulgurantes
                      viagens lisérgicas
      Aaarrrggghhh!
A leoa parisiense paria 1 cocozinho mais de lenda
                                           e de tédio
Porém a sede / o irresistível imã do desejo de mais mel
                                             aceso /
empurrava nosso Lord Jim Catacumbas a arrancar
                                             as barbas
a correr perseguindo a boceta de 1 anjo que somente dele fugia
((De Chirico observava como o olho da torre brotado sem regras))
O assassino sonâmbulo sentou-se sobre a ponte distraída
                                                            do Metrô Passy
O frio lhe abria as entranhas / o elo que unia a queda
de 1 sonho à torrente inestancável de outra viagem de haxixe
Essa noite a Comuna era massacrada para todo sempre
O bordel apodrecia com singular nonsense
O mais distante do rio!: rabiscou afônico o que restava
                                                      de instinto
O assassino / nu / ensaiava piruetas
arrastando em pedaços as gotas manchadas
                            do seu abrigo-bandeira
Sua navalha era o céu que renunciava a ser céu
A neve: a vítima
1 crucificação sem raízes povoava os vagões suspensos
                                               na memória
o vagabundo revoltoso que assaltava essa noite a história
                                              perdida do Metrô Passy
Riscado o p / o a / os dois ss / o y
Com golpes de vidro a estação foi batizada como
                                  Metrô Landrú
1 garrafada de tequila / 2 orações em turco
Meu palácio é de vértebras / meu rio Sena de urinas:
Já sem aspas o mundo
Em santa paz a carniça.



CORRESPONDÊNCIA INFRA

O mar toca nossos corpos
para sentir seu corpo
O mesmo em Manzanillo no cais pedregoso
que em Neviot / ilha de corais do deserto
Nós devolvemos seu sorriso de sal
desenhando nossos nomes & desejos
na casca dos caranguejos
que parecem buscar velhas pernas de pau devoradas
                                             pela areia
O mar ergue a cabeça
& canta a nós / no idioma mais nu & afim
                              ao nosso tato
Port Vendrés Ville ruge como atum encolerizado
                                 em nossos olhos
Bernard pendura 1 de suas argolas verde fluorescentes na cabeleira
                                            pontiaguda de 1 ouriço
Os outros pescadores de Saint Joan / Fetiche II
com seus camarões são cândidos a seu modo
com eles também é o mar que os filma fixamente
Ali onde afrouxam sua nervosa calça
& seus lábios não deixam de ulular
quando vem até as anginas dos rochedos de Gibraltar
movendo-se como dados ou peixes prateados
na sombra de suas garrafas de rum.




SAN JUAN DE LA CRUZ LE DA 1 AVENTÓN
A NEAL CASSADY /EN LA FRONTERA
ENTRE EL MITO & EL SUEÑO/

La carretera se pandea rumbo al centro de su propio
                                         incendio centrífugo
Tijuana se desvanece flotando bajo la mollera del ojo
Esquirlas de cabaret & colchón empujan la estela
 de duendes que preña la ilusión de este instante
En el radio: Jim Morrison traga esporas crecidas
                               en la cicatriz del diluvio
Este puente mental va al volante
Estrellado el afuera & adentro
Verde mota la selva
El destino rodando
Todo ser & hasta en zancos escupe ovnis bordados
con alas de las más locas luciérnagas
Es de noche / & en carretera / & volando
Los Doors con los dientes hacen realidad su voltaje
El cuerpo del alma se baña en el viaje
El centro se curva
La curva es salvaje
La carretera es Dios mismo
Cada ganglio / cada trozo
resbala: se esfuma
El pie va braceando
La mente desyerba la euforia del eco.

El asesino sonámbulo cruzó los portales de la pesadilla vacía
Nevaba en la azorada noche de abril
La huelga de basura había llegado a sus sienes
Apretaba el héroe su abrigo escarlata chorreado de esperma
La excitación le besaba los pies
Las botas / el olor a 1 destino presentido en fulgurantes
                                                   viajes de chemo
                               ¡Aaarrrggghhh!
La leona parisina paría 1 cagarruta más de leyenda
                                                 & de tedio
Pero la sed / el irresistible imán del deseo de más miel
                                                     encendida /
empujaba a nuestro Lord Jim Catacumbas a arrancarse
                                                      las barbas
a correr persiguiendo el coño de 1 ángel que sólo a él le huía
((De Chirico observaba como ojo de torre brotado sin reglas))
El asesino sonámbulo se sentó sobre el puente volado
                                             del Metro Passy
El frío le abría las entrañas / la atarjea que unía la caída
de 1 sueño al torrente imparable de otro speed de hashish
Esa noche la Comuna era masacrada para todos los tiempos
El burdel se pudría con singular sinsentido
¡Lo más lejos del río!: garabateó afónico lo que quedaba
                                                          de instinto
El asesino / desnudo / ensayaba piruetas
arrastrando a tajadas los carambanos manchados
                                 de su abrigo-bandera
Su navaja era el cielo que renunciaba a ser cielo
La nieve: la víctima
1 crucifixión sin raíces poblaba los vagones suspendidos
                                                    en la memoria
del clochard revoltoso que asaltaba esa noche la historia
                                        perdida del Metro Passy
Tachadas la pe / la a / la doble ese / la y griega
Con golpes de vidrio la estación fué bautizada como
                                             Metro Landrú
1 botellazo de Viuda / 2 oraciones en turco
Mi palacio es de vértebras / mi río Sena de orín:
Ya sin aspas el mundo
En santa paz la carroña.



CORRESPONDENCIA INFRA

El mar toca nuestros cuerpos
para sentir su cuerpo
Lo mismo en Manzanillo pedregoso
que en Neviot / isla de corales del desierto
Nosotros devolvemos su sonrisa de sal
dibujando nuestros nombres & apetencias
en el caparazón de los cangrejos
que parecen buscar viejas patas de palo devoradas
                                               por la arena
El mar se para de cabeza
& nos canta / en el idioma más desnudo & afín
                                       a nuestro tacto
Port Vendrés Ville ruge como atún encolerizado
                                       en nuestros ojos
Bernard prende 1 de sus aretes verde flúor en la cabellera
                                             alfilereada de 1 erizo
Los demás pescadores del Saint Joan / Fetiche II
desde sus camarones se sinceran a su modo
con éste también su mar que los filma fijamente
Ahí donde ellos se aflojan su nervioso pantalón
& sus labios no dejan de ulular
cuando ven hasta las anginas del Peñón de Gibraltar
moviéndose como dados o peces plateados
en la sombra de sus vasos de ron.






                                                                                                         

Manual de Literaturas de Língua Portuguesa do Pós-doutor João Adalberto Campato Jr.


Em março será lançada essa importante obra do Pós-doutor João Adalberto Campato Jr., com o apoio do Observatório dos Países de Língua Oficial Portuguesa (OPLOP) da UFF- Universidade Federal Fluminense. E sinto sincera satisfação em ser citado nessas páginas. Agradeço a leitura e a atenção que há tempos o Profº Campato oferece aos poemas que publico. Abaixo, partilho o link e algumas palavras sobre a obra:

"Um manual de literatura de língua portuguesa será lançado no Brasil nas próximas semanas. De autoria do Pós-doutor João Adalberto Campato Jr., o livro "Manual de Literaturas de Língua Portuguesa: Portugal, Brasil, África Lusófona e Timor-Leste, deve ser lançado no final do próximo mês. O professor já é conhecido internacionalmente por outras produções acadêmicas e por tratar de temas e autores "não-canônicos". O manual chega para preencher uma lacuna na academia brasileira que ainda carece de um material de tamanha qualidade quanto o que está sendo produzido pelo autor. O OPLOP é um dos apoiadores culturais desta obra e acredita que "sem sombra de dúvidas é um material inédito, prático e inovador".




   Hoje, 11/02/2016, a equipe da página Escamandro gentilmente publicou quatro traduções que realizei de poemas do Roberto Bolaño. Há ainda o texto introdutório, que resume biografia e justifica a escolha temática que relaciona os poemas traduzidos. Pela oportunidade agradeço ao Adriano Scandolara, Guilherme Gontijo Flores e Bernardo Lins Brandão, responsáveis pelas excelentes publicações e por manter ativo esse espaço dedicado à literatura.
   Aqui o link para acessar os poemas:

https://escamandro.wordpress.com/2016/02/11/roberto-bolano-por-gustavo-petter/


delicados
declives
desenham
em sombra
e luz a
silhueta
das vértebras

verticais
como árvore

ideogramas
impressos
compõem
o poema
de Li Po

em harmonia
com o silêncio
da página 

tempo 
percorre
o leitor
imóvel



o sol das seis
declina e incide
através do vidro
sobrepondo à débil
iluminação elétrica
lâminas acesas

a poeira
transpassa
o facho
de luz

olhos leem 
a queda de outro 
anjo desfeito
em fagulhas


Distante sabor sanguíneo

Talvez sejam gengivas enfermas
Talvez seja aquele poema da Ana C.
inscrito dentro semelhante à memória
da criança descobrindo que o sangue
tem sabor de ferrugem

A língua investiga os 
significados sanguíneos
Assim reage o corpo
ao pugilismo das palavras
Nuvens rosa
contra o azul
sussurrado

Palavras amanhecendo

Apazigua ouvi-las
soarem como oração
sobre a antiga culpa
por dançar a obscura
aliteração profética:

crianças crescerão incrédulas