Para Joanna Skorupski.

I.

A bisavó polonesa
cultivava flores
e possuía um apiário.
Os dias consumiam-se
entre pétalas e folhas
e alvéolos.

Compreendia o ritmo vegetal,
como os xamãs
curandeiros.

O alzheimer é a chama fosca
dos olhos fixos.
O alzheimer é o não indagar
o azul sem nuvens.
É esquecer os usos
silenciosos da adaga.

Foda-se a desmemória.
Reinventemos para mim
um nome:
sou o estrangeiro que ama
flores incomuns.
As inscreve na própria pele
para que não sejam breves
como os relâmpagos.

II.

Na página é branco
o silêncio.
Orno a monocromia
com estilhaços antigos,
colhidos na autópsia
da criança.

Havia o fogão a lenha,
o termômetro de mercúrio
em forma de galo.
Vasos, muitos vasos
na casa que chamávamos
chalé.
Na parede um brasão polonês,
águia
sobre um fundo rubro.

A Virgem negra 
de Czestochowa
abençoa
os herdeiros do holocausto.

Lembro dos livros
manuais de botânica.
O quadro
com borboletas mumificadas.
E no bojo de um vidro
o alvíssimo
cisne de açúcar
capturado
nas bodas
já esquecidas.





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