O Escamandro publicou dia 27 de julho mais traduções que realizei de poemas do Roberto Bolaño. São cinco poemas guiados pela relação temática com a cidade de Barcelona. Agradeço a Guilherme Gontijo Flores e Adriano Scandolara por compartilhar a poesia do Bolaño, que precisa ser lida tanto quanto sua prosa. Abaixo os links da mais recente publicação e da primeira:
https://escamandro.wordpress.com/2016/07/27/poemas-sobre-barcelona-de-roberto-bolano-por-gustavo-petter/
https://escamandro.wordpress.com/2016/02/11/roberto-bolano-por-gustavo-petter/
o movimento
da mandíbula
ao mastigar:
morder remo
er reescre
ver a forma
estrutura que
conduz o
paladar pela
pele e o corpo
retoma o ato
dionisíaco
deslocar
a mandíbula
não com
a violência
do soco
mas outro
local para
compreender
o nome
o poema
lugar por
excelência
onde deixa
de ser parte
de um sujeito
multiplica-se
signo comum
mecânica dos
gestos seja
canto sexo
oral ou
mesmo do
anti-ato
zen
de manter
o silêncio
da mandíbula
ao mastigar:
morder remo
er reescre
ver a forma
estrutura que
conduz o
paladar pela
pele e o corpo
retoma o ato
dionisíaco
deslocar
a mandíbula
não com
a violência
do soco
mas outro
local para
compreender
o nome
o poema
lugar por
excelência
onde deixa
de ser parte
de um sujeito
multiplica-se
signo comum
mecânica dos
gestos seja
canto sexo
oral ou
mesmo do
anti-ato
zen
de manter
o silêncio
I.
o
tempo goteja
lento
como a
solução
intravenosa
na
sessão de quimio
do
hospital das clínicas
a
percepção do tempo
de
espera é outra
caminhando
sob
árvores
frondosas
no
parque da redenção
pedalando
um barco
em
forma de cisne
sobre
o lago silencioso
demais
para estar
incrustado
no corpo
de
porto alegre
durante
o retorno
a
avó pergunta
como
foi a tarde
ouve
com sorriso sereno
absorvendo
a bem-vinda
dose
de morfina
II.
cumpridas
as exéquias
o
menino herdou
os
sapatos de festa
vermelho
ainda aceso
couro
deformado
pelo
contorno dos
pés
ossudos
calçara-os
em cerimônias
três
casamentos um batizado
a
dona da loja de roupas usadas
ofereceu
duas moedas
ante
a hesitação
vais
calçar aonde isso guri?
na
escola? ao corpo propenso
à
poesia e às artes
até
o momento ama
o
van gogh mutilado
símbolos
aferram-se
com
caninos ferozes
compro por cinco moedas
porque
eram da
tua avó
nos
dias seguintes
ainda
quis reaver
o
par de sapatos
Obra de Ernest Pignon-Ernest. http://pignon-ernest.com |
O percurso: sob
luz ainda esmaecida
retomar a leitura
(café já coado
exalando ao lado
preto como não
são as noites)
ler ler e ler
até a claridade
fulgir sobre
a pele dos móveis
Sem revoar da página
ouvir a urina
diluindo o silêncio
então a Vênus
não grandiloquente
como a de Botticelli
tampouco derruída
como a de Rimbaud
emerge desenvolta bela
à vontade no mundo
bermuda camiseta velhas
dedo dispersando
dos olhos os
resquícios
de pesadelos
escreveu com
inicial maiúscula
não se atreveu o suficiente
para conduzir ao extremo
a transgressão da linguagem
forma vociferando significado
pondero o impasse
há limites intransponíveis
mas não para a poesia
há limites intransponíveis
mas não para a poesia
o D maiúsculo é
impiedoso arremesso
lança aos olhos
o Deus pelo qual
rogam os homens
o verso soa
violenta voz
contra a paz
das palavras azuladas
pede o poema
que apuremos
os ouvidos
a alma faminta
os faz ganir
cães afoitos
sob as horas
noturnas
A tarde inteira
lendo histórias
em quadrinhos
Os super poderes
dos heróis não
os tornam mais
incríveis que
um passarinho
**********
O ciclope pedala
pela ciclovia
Ao redor
carros
rugem
Carrega na mochila
o livro de mitologia
grega emprestado
da biblioteca pública
Para o dever de casa
precisa fazer a sua
árvore genealógica
*******
A mãe
pendura
no varal
O sol
transforma
fantasma
em lençol
enreda-se
sobre si
com a beleza
que a ciência
dos nós de
marinheiro
não enleia
*
imagem no poema
evoca a hera
serpenteando
o pilar da varanda
erguida apenas
na lembrança da
criança que viu
a aranha mumificar insetos
oculta nessa selva
*
o pendurá-la no
trinco da porta
ou registro do chuveiro
é ato diferente
de fixar um quadro
na parede
*
o metal cromado
serve de espelho
a forma esférica
ao deformar
assim revela
a essência
de quem
espelha
*
a cor vermelha
entoa o ritmo
oposto ao do musgo
avançando sobre
a parede
embora haja
algo de noturno
no olor inscrito
entre as tramas
do tecido leve
*
mesmo esmaecido
o vermelho é voz
acesa entre a
cerâmica branca
como só no
poema é possível
sê-la em chamas
*
ela a despiu
inconsciente
da terrível
beleza do ato
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