Imerso na manhã de inverno. Lavar louça sugere imagens frias. Por exemplo, imensas geleiras guardam águas antigas, inacessíveis aos lábios ressequidos, à garganta sedenta. Lembro alertarem à criança para agasalhar-se bem contra o frio cortante. Imerso na manhã de inverno. Agrada pensar as mãos apunhaladas pelo fluxo que sai da torneira. Afoito em lavar logo para tornar a ler. A pia pouco cheia: taças de vinho, duas, pratos grandes e de sobremesa, quatro, talheres, oito. 
  A poesia, águas turvas mas não impuras. Nela ouvistes o ritmo das marés; o rumor da urina densa pelo sêmen; serviram de espelho para a lua; conduziram navios; sepultaram afogados. 
  Imerso na manhã de inverno. Lida horas antes uma obra sobre a Idade Média. Acaso no futuro publique alguns poemas, o título do livro será Leprosário.  

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